domingo, 30 de maio de 2010

Metade

Que a força do medo que tenho 
não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito 
não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito, 
a outra metade é silêncio.


Que a música que ouço ao longe 
seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que amo seja pra sempre amada 
mesmo que distante
Porque metade de mim é partida, 
a outra metade é saudade.


Que as palavras que falo 
não sejam ouvidas como prece 
nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta 
a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço, 
a outra metade é o que calo.


Que a minha vontade de ir embora 
se transforme na calma e paz que mereço
Que a tensão que me corrói por dentro 
seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que penso, 
a outra metade um vulcão.


Que o medo da solidão se afaste
E o convívio comigo mesmo 
se torne ao menos suportável
Que o espelho reflita meu rosto 
num doce sorriso que me lembro 
ter dado na infância
Porque metade de mim é a lembrança do que fui, 
a outra metade não sei.


Que não seja preciso mais do que uma simples alegria 
pra me fazer aquietar o espírito
E que o seu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo, 
a outra metade é cansaço.


Que a arte me aponte uma resposta 
mesmo que ela mesma não saiba
E que ninguém a tente complicar, 
pois é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia 
a outra metade é canção.


Que a minha loucura seja perdoada 
porque metade de mim é amor
e a outra metade também.


Oswaldo Montenegro ou Ferreira Gullar (Você decide!!!)

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