Do G1
Depois de 14 horas de discussão, o Senado da Argentina aprovou na madrugada desta quinta-feira (15/07) a lei que autoriza o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo no país. A decisão transforma o país no primeiro da América Latina e décimo país no mundo a autorizar casamento entre pessoas do mesmo sexo, depois de Holanda, Bélgica, Espanha, Canadá, África do Sul, Noruega, Suécia, Portugal e Islândia.
Um dia antes do debate no Senado, a Igreja fez uma concentração em frente ao Congresso como encerramento de uma ampla campanha contra a iniciativa impulsionada pela consagração por lei do casamento entre pessoas do mesmo sexo, à qual definiu como "um projeto do demônio".
A iniciativa para consagrar por lei os casamentos entre homossexuais, cujo alcance será geral, contempla reformar o Código Civil, alterando a fórmula de "marido e mulher" pelo termo "contraentes" e prevê igualar os direitos que os casais heterossuais têm, como a adoção, a herança e benefícios sociais.
"Hoje é um dia histórico. Pela primeira vez na Argentina se legisla para as minorias", afirmou o senador Miguel Pichetto, chefe do bloco do peronismo.
Ao apoiar a nova norma, o chefe do bloco da oposição radical, Gerardo Morales, afirmou que "chegou a hora de sancionar normas que se adaptem a novos modelos de vínculos familiares" e recordou a existência de "modelos de famílias diferentes (aos) que tínhamos há 30 ou 40 anos".
Centenas de manifestantes que aguardavam o resultado diante do Parlamento na fria madrugada desta quinta festejaram a votação, que apoiou uma decisão da Câmara de Deputados aprovada há algumas semanas.
O projeto de casamento entre pessoas de mesmo sexo dividiu a sociedade, que se expressou nos últimos dias em manifestações a favor e contra a lei, e em fortes polêmicas entre o governo de Cristina Kirchner e a Igreja católica.
A forte ofensiva da Igreja contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo abrangeu a mobilização de estudantes de escolas particulares católicas para a marcha em frente ao Congresso, bem como sanções a clérigos que não compartilharem da postura da hierarquia.
A presidente Kirchner, de visita oficial à China, se colocou à frente das demandas da minoria homossexual, apesar de o projeto ter sido uma iniciativa do opositor socialismo, e criticou a autoridade católica por convocar uma "guerra de Deus" contra o reconhecimento do casamento homossexual.
A aprovação pelo Senado argentino pode influenciar a legislação brasileira, onde projetos sobre o tema tramitam há pelo menos 15 anos, acreditam ativistas que defendem a causa no país.
“É uma decisão que tem um efeito fantástico num país em fronteira com o nosso. Tanto quanto o Brasil, a Argentina tem uma influência religiosa muito severa e conseguiu chegar lá. Acho que vai fazer nosso legislador rever seus conceitos. Ele não gosta de ver que nossa legislação está em descompasso”, acredita a desembargadora Maria Berenice Dias, uma das pioneiras na defesa de direitos homossexuais no país.
Presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABLGT), Toni Reis também acredita que a decisão do país vizinho deve repercutir no Brasil, assim como ocorreu com países europeus. Ele lembra que os dois candidatos à frente na disputa presidencial em outubro, Dilma Rousseff e José Serra, já se pronunciaram favoráveis à união civil de pessoas do mesmo sexo.
O projeto de lei em discussão na Câmara foi reunido a outro, de 2007, de autoria do deputado Clodovil Hernandes, morto em março de 2009. Antes deste, outra proposta, da então deputada Marta Suplicy, apresentada em 2005, nunca chegou a ser votada no plenário por falta de acordo entre líderes.
Um dos autores do projeto de lei atual sobre o tema que tramita na Câmara, o deputado José Genoino (PT-SP) diz ver um clima favorável para a aprovação da união civil no Brasil até o final deste ano. “Tenho conversado com os deputados e tem aumentado a receptividade com o projeto”,.Para Genoino, o Congresso brasileiro pode ficar com a pecha de “conservador” caso não siga o exemplo argentino e de outros países. “Na prática, isso já está acontecendo na lei. Temos dez decisões de tribunais federais reconhecendo a união de pessoas do mesmo sexo. A Caixa Econômica Federal já a reconhece para aquisição de imóveis, tem uma ação da Procuradoria Geral da República questionando o Supremo“, cita.
A proposta atual, que ainda deve passar por duas comissões da Câmara antes de chegar ao plenário, prevê a união civil, mas exclui do texto termos polêmicos como “casamento” e “adoção”. Segundo Genoino, esta foi a forma encontrada por deputados e ativistas dos direitos gays de evitar uma maior rejeição do projeto por outros parlamentares e a Igreja.
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