quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Plantão de Língua Portuguesa tira dúvidas por telefone

- Plantão gramatical, bom dia.

- Alô, o que é um oxímoro?

- É uma figura de linguagem que aproxima duas palavras ou expressões contraditórias, que se excluem mutuamente do ponto de vista lógico. Veja o exemplo extraído de um verso de Luís de Camões (1524-1580): "(...) É ferida que dói e não se sente/ É um contentamento descontente (...)". Contentamento descontente é um oxímoro, entendeu?

- Ah, sim, agora ficou fácil.

Alguns minutos depois, nova ligação:

- Tenho uma dúvida: palavras com super e inter ainda exigem hífen?

- Sim, desde que os prefixos estejam diante de palavras iniciadas pelas consoantes H e R, como nos casos de super-humano e inter-relação. Compreendeu?

- Entendi, muito obrigada!

Diálogos assim são a rotina para os funcionários do Plantão Gramatical de Fortaleza. Mantido pela prefeitura há 30 anos, o serviço esclarece dúvidas de Língua Portuguesa por telefone e fax. Perguntas sobre coerência textual, ortografia, sintaxe, uso de vírgulas e crase são as campeãs de atendimento, seguidas por questões referentes a figuras de linguagem e análise sintática. O plantão recebe, em média, 150 ligações diárias.

Segundo Francisco Marino, coordenador do serviço há 17 anos, 95% das ligações têm origem na região metropolitana de Fortaleza. Os 5% restantes vêm principalmente do interior do estado. Mas há gente que liga de lugares tão distantes quanto São Paulo. O perfil dos usuários é variado. Do outro lado da linha, pode estar um professor ou uma dona de casa, uma criança com dificuldade para fazer sua lição ou um médico. Para usar o serviço, não é preciso se identificar. Mas o tom de voz e o tipo de pergunta dão pistas da idade ou da ocupação do usuário. O tom solene de um homem com dúvidas sobre termos jurídicos sugere que ele deve ser advogado. Assim como a fala hesitante de uma menina que quer saber sobre análise sintática revela que ela provavelmente é aluna do Ensino Fundamental.

Seis pessoas se revezam no atendimento. Para responder às dúvidas, os plantonistas recorrem a obras de referência e à experiência pessoal. Numa sala do Instituto Municipal de Pesquisas, Administração e Recursos Humanos (Imparh), duas fileiras de mesas acomodam os atendentes, os dicionários e as gramáticas. Todos são formados em Letras com especialização no ensino de Língua Portuguesa e dois têm mestrado em Linguística.

De vez em quando, a equipe se depara com histórias pitorescas. Nessas três décadas de existência, diz Marino, o serviço chegou a ser usado até como consultório sentimental. É que alguns usuários são tão frequentes que se tornam amigos dos atendentes. A secretária Ivonete Souza recorre ao tira-dúvidas desde 1993 e garante que reconhece os "consultores" pela voz. "Gosto que todos os meus textos passem por revisão", diz.

O sucesso do Plantão Gramatical de Fortaleza vem inspirando ações semelhantes em outras regiões do país. Curitiba, Brasília e Jundiaí, a 60 quilômetros de São Paulo, são cidades que também já contam com atendimento. E uma iniciativa semelhante deve ser implantada no Rio de Janeiro em 2011.

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Matéria extraída da edição 238/Dez2010 da Revista Nova Escola.

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