por Henrique Miné
Eu só queria escrever. Olhei toda aquela criançada na escola onde trabalho, e eles estavam subindo nas coisas, correndo uma atrás da outra, rolando no chão, gritando músicas de duplo sentido como se fossem muito rebeldes, caçando sarna pra se coçar. Alguém deu um ponta pé em alguém, vieram me chamar.
“Por que você apanhou?”
“Porque eu roubei o lanche dele, professor!”
“Então devia ter apanhado mais por não me dar um pedaço!”
No próximo minuto, eles já eram amigos de novo, e dividiam outro lanche.
E eu fico olhando a minha colega de trabalho, minha idade, perspectivas completamente diferentes, ela não sai no horário de trabalho pra fumar um cigarro, não gostou quando deixei a quadra aberta pra eles jogarem bola, não fala palavrões para eles, muito menos chama por apelidos.
No entanto, me consola saber que, no fim, vamos acabar os dois na mesma merda. Eu queria escrever e, enquanto fingia que fazia alguma coisa, lamentava o fato de não ter um papel e uma caneta, lápis, que seja, por perto. O sono me consumia, o tempo não passava e eu só queria dar o fora dali e, quem sabe, comprar uma cerveja no boteco ao lado. “Olha o professor pinguço” eles diriam, que merda de exemplo eu sou.
Seja como for, tomei a cerveja depois, aliás, tomei as cervejas, porque o sol estava forte e eu não queria chegar em casa. No caminho, pensava em escrever, ainda tenho meus amores, ainda tenho minhas revoltas, mas no momento, só tinha uma ligeira embriaguez e um puta sentimento de impotência. Os carros passavam sempre apressados, alguns cachorros vadios esfregavam nas caras das pessoas o que é viver, elas ignoravam e continuavam pensando em ganhar ou gastar dinheiro, respirando fumaça, seguindo as leis, assistindo noticiários e não falando palavrões para crianças, as mesmas que, esses dias, me ensinaram como se faz filhos.
“É só botar o pau pra fora e mandar pra dentro, professor!”
No meio de tudo isso, eu. Meio bêbado a uma e meia da tarde de uma quinta-feira em uma avenida movimentada e com cara de cu. Parei na calçada pra procurar um cigarro, ou uma bala, nem lembro mais, na minha bolsa, não achei, um cara trombou em mim e ficou resmungando. Mais velho, do tipo que sonha em conseguir uma bosta de vida medíocre de classe média, e, enquanto não consegue, fica andando com camisas listradas de R$39,90 que tentam imitar as de R$399,90, com desconto. Fica ridículo, mas pelo menos ele tem um objetivo.
“Calçada não é lugar de ficar parado!”
Olhei pra trás, ele me mostrou o dedo do meio.
Continuei meu caminho meio cambaleante, sentei num ponto de ônibus para procurar o tal cigarro (ou bala, vai saber) e então vi um vira-lata parado no meio da calçada, assim como eu, e ele nem parecia do tipo fumante ou que gosta de bala, apenas estava ali, observando as pessoas com um olhar curioso, tentando entender onde diabos aquele monte de gente ridiculamente vestida da mesma forma ia tão apressado.
Ninguém mostrava o dedo pra ele.
_______________________
Extraído do excelente blog
do Henrique Miné
Nenhum comentário:
Postar um comentário